Focus Cia de Dança/Carlota. Alex Neoral/Coreografia. Maio/2023. Foto/Cristina Granato. |
Com poucos espetáculos inéditos em temporadas reduzidas, paralelo à ausência nos palcos de algumas das cias. brasileiras mais conhecidas do grande público, além do perceptível desaparecimento de uma qualitativa programação internacional.
E, no caso específico da cena carioca, com um índice comparativo bem menor em relação à paulicéia, não só quanto às raras cias estrangeiras, extensivo às escassas apresentações regulares de grupos locais.
Destacando-se, ali, a sempre admirável resistência cultural da SPCD – São Paulo Companhia de Dança, com sua temporada desdobrando-se em quatro períodos, entre criações inéditas e reestreias, sempre sob o seguro comando concepcional de Inês Bogéa.
E onde tivemos o privilégio de conferir obras inéditas com alto grau de inventividade como I’ve Changed My Mind, ousada exploração estética do vocabulário do movimento com a assinatura singular do coreógrafo israelense Shahar Binyamini ou do espanhol Goyo Montero e sua desafiante e inovadora releitura cênico/coreográfica de Petroushka com o olhar armado na contemporaneidade.
São Paulo Cia de Dança/I've Changed My Mind. Shahar Binyamini/ Coreografia. Junho/2023. Foto/Charles Lima |
Em outro dimensionamento estético, o Grupo Corpo voltando ao cartaz nas duas capitais, depois de um longo intervalo, e desta vez quebrando seu tradicional projeto cênico de um espetáculo novo, seguido ou antecipado por obra integrante de outro mais antigo, com uma revisita sem grande impacto, como aconteceu na segunda versão de Gil, a que se denominou Gil Refazendo.
Enquanto, no Rio, a maior regularidade nas apresentações de dança contemporânea ficou, quase exclusivamente, com a Focus Cia de Dança que, entre reapresentações de seu repertório, surpreendeu com a proposta coreográfica de Alex Neoral titulada Carlota. No entorno de onze composições de Astor Piazzola em imersivo mergulho numa pulsante dramaturgia corporal, dimensionada a partir das sonoridades contemporâneas do tango.
Das cias independentes cariocas, vale ressaltar o bravo descortino sensorial/memorialista da coreógrafa Esther Weitzman em Breve, sob o compasso da dança na passagem do tempo. Em conexo e singular ideário artístico reunindo, num mesmo propósito performático, a maturidade artística e profissional dela e de mais três nomes conceituados de nossos palcos dançantes - Frederico Paredes, Paulo Marques e Toni Rodrigues.
Mas os palcos coreográficos precisam urgente serem preenchidos novamente com aquelas cias independentes de reconhecida trajetória em temporadas de verdade e não apenas em apresentações isoladas e instantâneas. Como fazem falta espetáculos com obras inéditas da Renato Vieira Cia de Dança, do Renato Cruz e sua Cia Híbrida, da Sônia Destri Lie e sua Cia Urbana de Dança, da Márcia Milhazes Companhia de Dança, além do Márcio Cunha e Cia de Dança, sem deixar de lembrar também a especial singularidade social da Lia Rodrigues Cia de Danças junto ao Centro de Artes da Maré.
A temporada de espetáculos internacionais, cada vez mais rara, foi iniciada pelo Momix, na comemoração de suas quatro décadas, numa seleção com maioria de peças que o público já conhecia, mas sempre privilegiando as tendências performáticas sinalizadas por psicodélicos efeitos virtuais, muitas vezes deixando a corporeidade gestual em segundo plano.
Sendo terminada com o Evolution Dance Theater, espetáculo que fica mais próximo de uma destas instalações virtuais/cinéticas das plataformas digitais e do universo tecnológico das exposições, que de uma considerável representação propriamente de dança. Intermediada apenas por uma interessante e digna de registro Compañia Colombiana de Ballet mostrando obras criadas por um destes talentos brasileiros com trajetória reconhecida no exterior - Ricardo Amarante.
Que abrilhantou também sob moldes neoclássicos em apresentação recente, o Balé do Theatro Municipal através de composições autorais como Love Fear Gloss e o seu Bolero de Ravel. Falando em BTM/RJ, este vem a cada dia, depois de tempos difíceis e controvertidos, retomando seu lugar ao sol como a mais tradicional companhia clássica do País.
O que pode ser constatado no qualitativo e elogiável resultado artístico, apresentado desde criações com um sotaque contemporâneo caso de Macunaíma, estreada em 2022, ou em clássicos do repertorio como O Corsário que, afinal, acabou fechando com chave de ouro as portas da restrita retrospectiva coreográfica 2023...
Wagner Corrêa de Araújo
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