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18 março, 2021

A pandemia e os conflitos entre pais separados

Niver M. Bossle Acosta, advogada Especialista em Negociações pela Harvard Business School – HBX, com 15 anos de prática na Advocacia Cível Contenciosa nos Estados de RS e SP e 5 anos de dedicação ao Direito de Família Consensual em todo o Brasil.

(Dra. Niver Bossle Acosta-Divulgação)

A pandemia tem acirrado os ânimos dentro de casa. E em casas separadas, também. Pais divorciados têm enfrentado vários conflitos, até então inexistentes. Aula presencial para os filhos, é a favor ou contra? Como se resolve isso? A mãe se cuida e o pai não quer usar máscara? Estas questões vêm gerando muitas discussões. Como aplicar as negociações no dia-a-dia das famílias que se dissociaram?

É indiscutível que a autoridade parental é a mais ampla voltada para direitos e obrigações em relação às crianças, isso se chama guarda. O compartilhamento do tempo, por sua vez, é a possibilidade de tê-los na sua companhia e estreitar laços de afetividade e parentalidade com os filhos, no caso de pais separados.

Então quando as questões que envolvem a pandemia giram em torno do assunto “guarda” há um equívoco, porque o isolamento social - causado pela pandemia - não teria a capacidade por si só de fazer alterações em guarda, e sim, talvez um manejo transitório em relação a convivência desses pais separados com os filhos.

Em relação ao compartilhamento para que haja uma modificação nessa convivência é necessário, sobretudo, que se observe o melhor interesse das crianças e adolescentes. Isso é pacífico.

Mas aí nos deparamos com a necessidade de acatar recomendações dos órgãos de saúde por conta dos avanços da alta contaminação do covid-19, através do isolamento social. E o que fazer então em relação a essa alternância de compartilhamento de tempo?

À princípio, eu digo: nada. É necessário verificar a real necessidade de estabelecer um novo esquema diante apenas do risco iminente e factível de uma contaminação. Porque não existe ainda uma uniformização nas decisões submetidas ao judiciário em relação a este tema especificamente. Na verdade, eu creio até que nem existirá, porque as situações familiares são particulares e é preciso analisar cada situação de forma individualizada para poder manter um equilíbrio e fazer prevalecer de fato o melhor interesse das crianças.

E diante da inexistência de um regramento que possa se aplicar nessas situações totalmente atípicas, vale o perfeito diálogo entre os pais, para que mantenham proporcionando um ambiente mais favorável pra que as crianças se desenvolvam tranquilamente em meio a pandemia. Se os pais mantiverem a autonomia, podem fazer ajustes de uma forma transitória e isso não implicará em reversão de guarda, ou alteração no compartilhamento do tempo com os filhos. É apenas uma composição transitória para que pais e filhos mantenham laços de afetividade, com segurança pra esta família.

O problema está em situações em que não há espaço para o diálogo, onde os pais não conseguem chegar a um acordo. E muitas vezes, os pais nem precisam estar separados para discordarem. Eles podem ter impressões diferentes sobre a forma como conduzir um isolamento requerido pelas autoridades.

Nesses casos mais difíceis, é preciso se perguntar: 

“Existe alguma situação de risco efetivo para que se busque um novo regramento nesse compartilhamento? Para que se faça uma alteração mesmo que transitória, isso é factível?”
“Para a criança, o que é mais importante no momento? Manter o vínculo, interromper temporariamente ou alternar?”

Essas questões são pontuais pra que a gente possa estabelecer, porventura, um regramento diferenciado de forma autônoma. Isto vale também para a questão da volta às aulas presenciais. É claro que se roga pelo bom senso, mas é difícil esperar isso de casais que estão vivendo um conflito pessoal e que ao mesmo precisam tomar decisões importantes de interesse das crianças. Quando as pessoas não têm um diálogo fluído eu aconselho que busquem auxílio de terceiros. Não necessariamente precisam contratar um advogado familiarista, um mediador ou remunerar alguém pra fazer isso, mas uma pessoa de confiança da família, que tenha uma relação imparcial e consiga dar um pouco de tranquilidade para a tomada de decisões dos pais.

Um exemplo é a professora da escola onde a criança estuda, que de certa forma compreende um pouco mais a fundo a situação dessa família e a necessidade do menor, esclarecendo para aquele caso em particular se a aula online é válida ou não, se faz sentido para aquela criança, ou se o convívio com os colegas é mais benéfico, etc... Nessa situação, vale apelar para quem possa trazer segurança. As pessoas estão tão envolvidas no problema que é preciso separá-las desse conflito e entender mais sobre quais as necessidades da família e em especial, quais as necessidades das crianças, e o que está em jogo.

A pandemia é um problema avassalador e tirou o mundo da zona de conforto, mas não é a única problemática que desconforta casais em crise. Por isso é necessário saber gerenciar seus conflitos tendo a certeza que o judiciário não é a porta de salvação. Salvação é manter a autonomia para exercer de forma ampla e satisfatória o poder parental em benefício das crianças.

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