Quem sabe lidar com a morte? Como aceitar perder as pessoas que amamos para morte?
O Dr. Junior Silva, Psicanalista e especialista nesse assunto, explica mais sobre como lidar com a morte e, principalmente, com a perda de um filho
(Divulgação)
Ao ligar a TV, ao ler as notícias ou acessar as redes sociais, somos bombardeados de notícias sobre a morte. As pessoas estão perdendo amigos e familiares. É quase impossível não conhecer ninguém que não tenha uma história sobre morte ou luto para contar.
Ontem, 31 de maio, João Miguel, filho do humorista Whindersson Nunes e da estudante de engenharia civil Maria Lina, faleceu. O bebê nasceu prematuro de 22 semanas no dia 29 de maio, último sábado, e passou dois dias internado na UTI.
Whindersson publicou um trecho da bíblia e uma mensagem nas redes sociais na tarde de ontem: "Deixai vir a mim os pequeninos, porque deles é o Reino dos Céus. Mateus 19:14", escreveu o humorista. "Filho, escrevi essa música no hospital, queria que você ouvisse na sua saída, atestando o maior milagre. E você saiu, não pra casa, mas pra melhor casa, ao lado do melhor. Desculpa as pessoas falarem de você, tão pequeno, sem nem poder se defender. Eu realmente tento entender. Talvez seja um dos motivos d'Ele ter suado sangue na oração do Getsêmani, deve ser muito difícil amar toda a humanidade até o último segundo, amou tanto que pingava sangue do seu corpo, de tanto amor por nós. E eu tento não odiar quem desejou mal ao meu filho, mas eu sou humano, meu coração parece que vai sumir pra dentro e engolir meu peito".
Whindersson soma mais 115 milhões de seguidores apenas nas contas do Instagram, YouTube e Twitter. Sua vida pessoal e profissional sempre é notícia.
Conversamos com o Dr. Junior Silva, Psicanalista, Hipnólogo e Coach, para entender mais o motivo pelo qual a morte mexe tanto com as pessoas, principalmente quando pais perdem seus filhos. Ele também explicou mais sobre o luto e deu algumas dicas valiosas de como passar por esse período.
- Por que não estamos preparados para a morte?
Dr. Junior Silva: Quem sabe lidar com a morte? Como aceitar perder as pessoas que ama para morte? Arrisco-me em dizer que a maioria das pessoas que leram estas perguntas responderam: - Não sei lidar!
Porque não fomos ensinados a perder. Aqui no Brasil, como em outras culturas, nós não gostamos da perda e não lidamos bem com esses sentimentos. Por exemplo, o Butão é considerado o país mais feliz do mundo e eles encaram a morte de um jeito muito diferente, se comparado com a nossa cultura. As pessoas naquele país não veem a morte como fim, mas como passagem para uma nova vida, onde a pessoa tem o direito de viver o novo. Eles fazem algumas reuniões pós-morte para relembrar e celebrar o legado, as coisas boas que aquela pessoa que se foi construiu.
- Dr. Junior, por que a morte de um filho parece doer mais do que outras perdas?
Dr. Junior Silva: Quando falamos de pessoas mais próximas como esposo, esposa, pai, mãe e filhos tudo se torna mais difícil. Mas quando falamos em perda de filhos, tudo é mais complicado, sabe por quê?
Dizem que a lei na natureza nos faz acreditar que os mais novos enterram os mais velhos, sem contar que existem definições para algumas perdas, por exemplo: quando perdemos a esposa ou esposo, ficamos viúvos; quando perdemos os pais, ficamos órfãos. E quando perdemos filhos qual é a definição? Na verdade não existe e isso nos faz compreender que a dor da perda de um filho por um pai e uma mãe, não tem definição.
Infelizmente é comum ver casais que perdem filhos se separarem, homens e mulheres entrarem em vícios, depressão, entre outros prejuízos emocionais onde a vida é “deixada de viver”. Um filme que mostra esta realidade se chama “Beleza Oculta”, que tem como protagonista Will Smith. Na história o personagem perde sua filha de 6 anos. Outro longa, baseado em um livro best seller, e que trata sobre esse assunto é “A Cabana”.
- Como superar a perda de um filho?
Dr. Junior Silva: Nesta semana tivemos uma notícia muito triste que foi a perda do João Miguel, filho de Whirndersson Nunes e Maria Lina. Com mensagem emocionante nas suas redes sociais, ele tentou definir em palavras sua dor, mas sabemos que essa dor não tem definição.
Vou confessar para vocês, eu passei por esta situação. Antes das minhas filhas Ana Laura e Maria Alice nascerem, perdi um filho que estava na quadragésima semana de gestação. Por isso, tudo que falo aqui não digo somente como psicanalista, mas como pai que entende dessa dor. O que falo para meus pacientes é o que precisei viver também, quando precisei ressignificar minha vida. Os filhos sempre serão nosso motivo de vida, e quando eles partem precisamos ressignificar. Tenho certeza de que o Whindersson e a Maria vão ter outros filhos, como eu tive oportunidade em ter meus amores, mas isso não quer dizer que ressignificar não será necessário, pois um novo sentido de vida precisa brotar dentro dos nossos corações. Por exemplo, quando o menino Ives Ota de 8 anos foi morto pelos sequestradores, seus pais Masataka Ota e Keiko Ota fundaram o Instituto Ives Ota, uma ONG que ajuda e ajudou centenas de pessoas da zona leste de São Paulo e também fundaram o Movimento Paz e Justiça. Esta foi a forma que eles encontraram de dar um novo significado às suas vidas: ajudando outras pessoas. O importante, sempre, é encontrar um novo sentido para vida. Não estou dizendo que é fácil, mas cada pessoa precisa encontrar esse caminho.
Tanto nos filmes que citei aqui e das histórias reais, todos eles precisaram percorrer este caminho. Não digo que foi fácil, mas valeu a pena.
- O que é o luto? É importante viver esse luto?
Dr. Junior Silva: O luto é um conjunto de sentimentos de uma perda significativa, que pode ser gerada por uma morte ou qualquer situação que, temos a certeza, é irreversível. Ou seja, não temos mais o que fazer, nem viver com aquela pessoa ou situação.
Viver o luto é organizar nossos sentimentos, é encerrar uma etapa da vida e recomeçar outra. Quando reprimimos a fase do luto corremos o risco de ter consequências emocionais lá na frente. Tudo o que não é “resolvido”, um dia nossa mente vai cobrar.
Eu atendo uma paciente dos Estado Unidos que não conseguiu viver o luto da perda da mãe. Houve negação e, devido a distância, não conseguiu chegar a tempo para se despedir e vivenciar aquele encerramento de ciclo.
Essa negação do luto trouxe consequências físicas nela, ou seja, tinha dores psicossomáticas de origem emocional. A maioria dos sintomas dela era o que a mãe sentia na luta pelo câncer. Quando ela vivenciou o luto e se reconciliou com seus sentimentos e a perda, suas dores desapareceram.
- Como podemos passar pelo momento da perda com mais facilidade?
Dr. Junior Silva: A dificuldade de viver o luto acontece muito quando nos sentimos em dívida com quem nos deixou. Por exemplo: não fiz isso, não disse aquilo e agora não posso mais. Vivenciar com mais facilidade é reconhecer o quanto o outro foi importante em nossa vida, e tudo que vivenciamos de positivo ou negativo se tornará, daqui para frente, um legado de vida, e não de destruição. Dependendo das dívidas que temos e como lidamos, precisamos, às vezes, de um auxílio profissional.
- O que podemos aprender com a perda e com o luto?
Dr. Junior Silva: Podemos aprender com luto que tudo tem o fim e que precisamos vivenciar o hoje como se fosse o último dia! O luto bem vivido nos traz o reconhecimento da importância e o que o outro deixou de especial, pois o que perdemos pode não estar mais presente fisicamente no dia a dia, mas estará no coração para o resto da vida. Uma coisa muito importante: o luto não é o fim, mas o começo de um novo tempo de alguém, ou de algo, que nos ajudou a ser quem somos hoje! Como Padre Marcelo Rossi sempre diz: Saudade sim, tristeza não!
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